Desabafo autoral sobre um diálogo implorado

Anos de consulta pública, 14 meses entre a CPI e a aprovação do PLS. A maior parte da classe nunca se manifestou. O comentário que eu mais ouvia por aí de quem conversava conosco era de que somos uma classe apática e desunida. Apesar disso, o GAP – Grupo de Ação Parlamentar Pró-Música, do qual tenho a honra de fazer parte – se mobilizou, gastou do próprio bolso para ir diversas vezes a Brasília, participou de inúmeros debates, audiências públicas, consultas e tudo mais. Ninguém nunca nos convocou ao debate, afinal o interesse é nosso. Ninguém nunca ligou para minha casa para saber minha opinião, Lobão. Mas minha turma e eu enchemos o saco de muita gente. Foi sempre um sufoco para convencer qualquer artista a dar palpite. Quanto mais a participar. Se eu colocava algum post no Facebook sobre o assunto não tinha comentários nem “curti”. Quantas vezes reclamei disso com o Dudu Falcão, que também tentava mobilizar os amigos? Ficamos de chatos, politizados. Alguns de nós foram processados e outros pararam de receber seus direitos, mas prosseguimos.

Agora que conseguimos abrir a caixa-preta do ECAD e, com a associação com o Executivo, o Legislativo e o Procure Saber, conseguimos aprovar uma lei que re-estabelece a fiscalização do ECAD – monopólio privado criado por lei sob a supervisão e fiscalização do CNDA (órgão estatal), que foi extinto pelo Collor junto com o MinC -, vem um grupo pequeno de autores manipulados (ou aterrorizados) pelo Escritório reclamar que não foram consultados. Ora, onde vocês estavam quando precisávamos de vocês? Por que não se manifestaram durante todos esses anos? Por que só agora saíram de seus mutismos?

Desde abril muitos autores se engajaram nessa história, entre eles alguns que são grandes arrecadadores e que, na teoria, seriam os principais prejudicados por mudanças. Por que arriscariam suas reputações e seus rendimentos se não acreditassem no que estão apoiando? Poderiam simplesmente ter ficado calados. A mobilização virou uma multidão que representa uma infinidade de estilos. De Gaby Amarantos a Nando Reis. De Roberto Carlos a Emicida. De Thiaguinho a Frejat. A história vai mostrar que os autores saíram vitoriosos e que o Direito Autoral vai ganhar credibilidade e transparência. Não temos medo de assumir essa responsabilidade, principalmente diante dos que ganham pouco e têm medo de ficar sem nada. Podem vir cobrar daqui a alguns anos. Aceitaremos os elogios e os agradecimentos também.

Que os funcionários das Sociedades reclamem, é natural. Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Abel Silva, entre outros, estão do lado dos que não queriam mudanças. Mas não dá para uma pessoa inteligente cair na conversinha de que são a parte “pura” dessa história. Estatização, Rede Globo, Creative Commons, PT, Google, todos associados contra nosso “pobre e virtuoso escritório” e contra os autores. É a teoria conspiratória mais improvável e destrambelhada do mundo. Como se os dirigentes da gestão coletiva fossem exemplos de probidade e não tivessem sido condenados por desvios – como no caso Coitinho – e por formação de cartel e a CPI não tivesse indicado 13 funcionários para investigação ao Ministério Público. Como se a sociedade como um todo não tivesse horror aos métodos do ECAD. Como se quem paga não ache extorsivo e quem recebe não ache que é pouco.

A aprovação aparentemente rápida da Lei veio de um momento político de consenso depois de décadas em que autores e sociedade pediam mudanças profundas num sistema que se mostrava intocável atrás de sua arrogância e de seu poderosíssimo lobby, bancado com o nosso dinheiro. Mas água mole em pedra dura…

Se alguém realmente acredita que não houve diálogo, não foi por culpa de quem vem batalhando pela justiça, transparência e eficiência da gestão coletiva. Imploramos anos por ele.

O trabalho está só começando. Espero que a classe não se desmobilize outra vez. A conversa tem que continuar. Mas agora nós, autores, temos o direito de comemorar uma vitória histórica que vai marcar o início de um novo ECAD que poderemos dizer que nos representa.

Leoni

13 respostas em “Desabafo autoral sobre um diálogo implorado

  1. Muito bem Leoni! Estamos juntos, como sempre. Desde a época da criação da SOMBRAS, onde tive a honra de trabalhar com Maurício Tapajós e Sidney Muller, entre outros, estou lutando e gritando contra esses “ladrões” que se dizem também músicos.
    Conte comigo para o que der e vier. A nossa luta continua, em busca da prisão – muta é muito pouco – daqueles que nos enganaram todos esses anos.

    Cláudia Savaget

  2. Grande Leoni !!!! Você também me representa!!!!
    Estou orgulhosa desses guerreiros incansáveis que nunca perderam a esperança .
    Só posso dIzer: MUITO OBRIGADA !

  3. Disse tudo Leoni!
    Só aparecem para criticar, nunca fizeram nada para ajudar e agora que estamos conseguindo realizar as mudanças, acabar com a roubalheira, essa gente quer destruir as nossas conquistas.
    Não vamos permitir!
    Essa luta vem de muito tempo.
    Já faz alguns bons anos, nos reuníamos na casa da Thereza Tinoco para discutir como conseguiríamos que o ECAD sofresse uma intervenção, minha querida Rosinha de Valença estava sempre presente, éramos poucos, ninguém queria saber, nós nunca conseguimos tirar essa turma de lá.
    Mas hoje é diferente, estamos conseguindo trazer compositores e autores importantes para o nosso lado e vamos defenestrar essa corja.
    Você, Tim Rescala, Ivan Lins e Sergio Ricardo realmente me representam.
    Estou com vocês e não abro!

  4. Bravo Leoni,
    Também fizemos um trabalho isolado e continuo, junto à vários senadores – Randolfe, Humberto, Aloysio, etc
    Persiste um sério problema…sem o CNDA, desativado por Collor e extinto por lei no Governo Fernando Henrique, todo o controle e fiscalização do ECAD ficará nas mãos de um grupelho que já vinha se organizando desde a época do Gil e do Juca no MinC. Ninguém percebeu isto…
    Vamos batalhar pela recriação do CNDA em moldes mais atuais, com a participação dos Ministérios que realmente tem afinidades com o problema – Justiça, Cultura e Trabalho e Emprego, assim como da sociedade civil (músicos)…
    Maestro Jácomo Bisaglia

    • Caro Jácomo, no mesmo dia em que a Lei foi aprovada no Senado seguimos em comitiva para pedira à Presidente Dilma para criar o IBDA, Instituto Brasileiro de Direito Autoral, para assumir as atribuições que agora estão endereçadas ao MinC. Esse Instituto será um órgão técnico de orçamento pequeno composto por funcionários concursados, comandado por um Conselho com maioria de compositores. Acho que isso vai resolver nosso problema. O que você acha?

      • ESTA PROPOSTA DE CRIAR MAIS UM ÓRGÃO PÚBLICO, EXECUTIVO, PARA ADMINISTRAR UM PROGRAMA PRIVADO ESTABELECIDO POR LEI, VEM DESDE UMA CAMARILHA LIGADA AO GIL E AO JUCA, CREIO QUE É A MESMA QUE HOJE ESTÁ COM A MARTA. ELA JÁ MENCIONOU TER UM GRUPELHO PARA “CRIAR” O INSTITUTO.
        A SOLUÇÃO MAIS ALTA SERIA RESTABELECER O CONSELHO NACIONAL DO DIREITO AUTORAL, ATUALIZADO E MAIS AMPLO E COM A PARTICIPAÇÃO DOS MINISTÉRIOS REALMENTE ENVOLVIDOS COM A PROBLEMÁTICA – JUSTIÇA, CULTURA E TRABALHO…MAIS A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL ATRAVÉS DE ÓRGÃOS QUE REALMENTE REPRESENTEM OS MÚSICOS E COMPOSITORES…
        ALGUNS PONTOS EXTREMAMENTE NEGATIVOS PERMANECERAM OU FORAM INTRODUZIDOS NESTE PROJETO QUE ESTÁ INDO PARA A SANÇÃO DA PRESIDENTE:
        1.- O PROJETO RETIROU A FORMA TRADICIONAL QUE PERMITE UM DECRETO REGULAMENTADOR POR PARTE DA PRESIDÊNCIA, DEIXANDO ISTO DIRETAMENTE PARA O MINISTÉRIO DA CULTURA ASSIM COMO TODO O PROCESSO DECORRENTE. INCLUSIVE NORMATIVO, ADMINISTRATIVO E FISCALIZADOR. ALGUNS SENADORES SE MANIFESTARAM A RESPEITO – HUMBERTO, RANDOLFE E ALOYSIO, DENTRE OUTROS.

        2.- O MAIS GRAVE – FOI INTRODUZIDO NO ART. 2º ÍTEM XIV …QUE, DENTRE OS TITULARES ORIGINÁRIOS (AUTORES, COMPOSITORES, ETC, TAMBÉM SERIAM CONSIDERADOS COMO “TITULARES DE DIREITOS AUTORAIS AS “” EMPRESAS DE RADIODIFUSÃO””.
        ISTO É, EMPRESAS QUE DIVULGAM E CONSOMEM COMERCIALMENTE MATERIAL MUSICAL E, LOGICAMENTE DEVERIAM PAGAR DIREITOS AUTORAIS, PASSARÃO A SENTAR NA MESMA MESA E COM IGUALDADE DE DIREITOS DOS AUTORES SOBRE A ADMINISTRAÇÃO DO ECAD.
        É A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO ANTIGO “JABÁ” …
        NATURALMENTE UM LOBIE DA ABERT-GLOBO, UMA DAS MAIORES DEVEDORAS DO ECAD…
        E NINGUÉM FALA NADA????

  5. Em todas as profissoes a historia repete-se: ha’ os que vivem dizendo que a coisa esta’ errada – sao os desagradaveis, que nunca estao satisfeitos; ha’ os que vivem em cima do muro esperando para ver para que lado vao pular; e ha’ aqueles que tiram proveito dos desmandos, e a esses nao interessa mudar nada.
    Voces conseguiram reunir um bom grupo, nao parem de brigar por aquilo que lhes e’ devido.
    Mais uma vez, muito boa sorte.

  6. A Luta esta só no começo, parabéns ao seu grupo Leoni que nos representa, o que sinto por outros artistas não se mobilizarem e simplesmente sumirem é vergonha, bundamolisse pura! Continue na luta guerreiro e explique para outros colegas que isso é importante.

    • É isso aí Leoni, cv está de parabéns pôr lutar pelo os seos direitos.
      Eu sou um compositor e tenho várias músicas na gaveta, justamente porquê só tenho encontrado aproveitadores, tipo, me dê estas músicas que vc ganha muito dinheiro com os direitos autorais.
      mas quanto existir,estas mãos cheias de dedos, no comando dos direitos autorais elas iram ficar na gaveta.
      Um grande abraço, e boa sorte pra todos nós.

      manoel san.

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